O Lucro do Caos: Como a Retórica do Exagero Redefiniu a Comunicação Pública

Última atualização: 5 de março de 2025
Tempo de leitura: 4 min

A ascensão das redes sociais como arenas de debate público transformou radicalmente a forma como ideias são discutidas e divulgadas. No entanto, essa evolução trouxe consigo uma preocupação preocupante: a chamada “Estratégia do Caos”. Baseada na retórica do exagero e na ancoragem no extremo, essa estratégia molda narrativas, radicaliza discursos e reduz a possibilidade de um debate racional. Nada mais parece razoável; o centro político e ideológico se esvazia, enquanto extremos opostos se fortalecem e monopolizam a atenção pública. Mas, em um mundo onde o caos se torna normal, quem realmente sai ganhando? A resposta pode estar em um conceito cada vez mais evidente: “O Lucro do Caos”.

O princípio fundamental dessa estratégia é a Teoria do Pior Cenário. A construção discursiva do medo, da indignação e da iminência de catástrofes cria um senso de urgência perpétuo. Quem controla essa narrativa tem o poder de influenciar decisões políticas, impulsionar movimentos ideológicos e, principalmente, gerar lucro. O medo vende. O exagero viraliza. E, no turbilhão de desinformação e polarização, poucos percebem que estão sendo conduzidos a uma forma altamente sofisticada de manipulação.

As redes sociais, projetadas para maximizar o engajamento, tornaram-se o ambiente perfeito para esse modelo. Algoritmos privilegiam conteúdos que geram reações intensas, sejam elas de indignação ou entusiasmo. Publicações que evocam raiva, medo ou choque se espalham com velocidade superior às que promovem equilíbrio e reflexão. Essa lógica impulsiona um ciclo vicioso onde a radicalização não é uma falha do sistema, mas sim um produto desejado e amplamente explorado.

A política é um dos campos mais afetados por essa dinâmica. Líderes populistas e partidos extremistas compreenderam rapidamente que discursos moderados não ressoam tão bem quanto promessas grandiosas ou ameaças existenciais. A retórica do exagero substitui a política do diálogo, e a governança se torna um jogo de manipulação emocional. Enquanto a sociedade se fragmenta em bolhas cada vez mais impermeáveis ​​ao contraditório, o caos se fortalece como uma ferramenta de poder, alimentando o lucro do caos.

No mercado da informação, esse modelo também se mostra altamente lucrativo. Veículos de mídia, influenciadores digitais e estrategistas de comunicação exploram o sensacionalismo para garantir audiência. O apocalipse iminente, seja climático, político ou social, gera cliques e compartilhamentos. A verdade se torna secundária frente ao impacto da manchete. Em meio a essa realidade, empresas e grupos de interesse lucram com a desorientação do público, seja vendendo soluções mirabolantes ou direcionando o medo para fins comerciais e políticos.

A ancoragem no extremo torna difícil o retorno ao debate racional. Quando todo argumento se baseia na premissa de que o outro lado representa uma ameaça absoluta, a disposição para o diálogo desaparece. O resultado é uma sociedade cada vez mais reativa, onde a busca por consenso e compreensão dá lugar à necessidade de vencer o oponente a qualquer custo.

No entanto, permanece uma pergunta essencial: quem ganha com isso? Grandes corporações de tecnologia prosperam com o engajamento desmedido. Figuras políticas oportunistas consolidam o poder explorando o medo. Setores econômicos inteiros se beneficiam da história e da incerteza. Enquanto isso, a sociedade como um todo perde. O espaço para a reflexão crítica e a construção de soluções reais é limitado, e as respostas para os desafios contemporâneos se tornam inviáveis ​​diante da radicalização do discurso público. Esse é o mecanismo por trás do o lucro do caos.

A Estratégia do Caos não é um acidente. É um modelo projetado para beneficiar poucos às custas da coesão social e da estabilidade democrática. A única forma de quebrar esse ciclo é compreender sua lógica e buscar alternativas que privilegiem o pensamento crítico e o debate construtivo. Caso contrário, continuaremos reféns de um jogo onde o caos é o combustível e o consenso, um inimigo a ser derrotado.

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Marcelo Molnar

Sobre o autor

Marcelo Molnar é sócio-diretor da Boxnet. Trabalhou mais de 18 anos no mercado da TI, atuando nas áreas comercial e marketing. Diretor de conteúdo em diversos projetos de transferência de conhecimento na área da publicidade. Consultor Estratégico de Marketing e Comunicação. Coautor do livro "O Segredo de Ebbinghaus". Criador do conceito ICHM (Índice de Conexão Humana das Marcas) para mensuração do valor das marcas a partir de relações emocionais. Sócio Fundador da Todo Ouvidos, empresa especializada em monitoramento e análises nas redes sociais.

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